A opção ambiental chinesa
Os graves problemas de saúde, decorrentes da poluição,
enfrentados pela população da China, levaram o país a um pacto interno, com a
redução da taxa de crescimento em cerca de 30%, até 2020.
blog do professor paulo márcio
economia&arte
Coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 12 de março de 2014
Paulo Márcio de Mello*
► O governo chinês anunciou, em novembro
do ano passado, a decisão de adotar horários mais flexíveis para o
funcionamento das escolas, a exemplo do "snow day" norte-americano
(quando a neve ameaça a saúde das crianças), e a suspensão das aulas quando os
níveis de poluição atingirem cifras que justifiquem a interrupção.
► O anúncio, feito pelo Ministério da
Proteção do Meio Ambiente, foi precipitado pela informação de que uma menina de
oito anos adquirira câncer de pulmão, em consequência da exposição a que fora
submetida, por viver próxima a uma estrada em Nankim.
► A intensa utilização do carvão pela
China como fonte de energia é causa do aumento de 56% dos casos de incidência
deste tipo de câncer, entre 2001 e 2010. Tornou-se a principal causa de morte
entre os homens chineses e a segunda entre as mulheres.
► A nota oficial evoca a adoção de medidas
para reduzir os níveis de poluição, quando eles assim justificarem, através da
suspensão da produção fabril, da restrição da circulação de veículos e até da
produção de comida nas ruas.
► Entre 2001 e 2010, o crescimento médio
do consumo mundial de energia atingiu 1,5%, enquanto na China chegou a 15%. Os
números destacados do crescimento chinês, no entanto, foram acompanhados de
níveis acentuados de desigualdade, com o índice de Gini de 0,67 ponto.
► No Fórum Econômico Mundial de Davos
(WEF), realizado em janeiro passado, no debate com representantes destacados
dos BRICS sobre uma possível "crise de meia idade" do bloco
(http://g1.globo.com/globo-news/globo-news-documento/videos/t/todos-os-videos/v/painel-debate-futuro-dos-brics-no-forum-economico-mundial-em-davos/3103897/),
destacou-se Liu Mingkang, do Instituto Global Fung e ex-autoridade em regulação
bancária chinesa.
► Indagado sobre uma desaceleração do
ritmo do crescimento da economia chinesa, Liu Mingkang confirmou que, nos
últimos três anos, esta desaceleração chegou a 30%, com a queda das taxas de
crescimento do PIB, de 9% para algo entre 7% e 8%, e que, em 2014, talvez caia
mais um pouco.
► Segundo ele, o povo e o governo chinês chegaram
a um consenso. A história por trás de um crescimento acelerado foi criar um
ambiente para investimentos em capital fixo e uma economia voltada para a
exportação. E o que a China conseguiu com isso? Um aumento apenas marginal nas
receitas geradas por tributos e alguns projetos econômicos, não inteiramente
viáveis.
► Concluíram que o que deram à população
chinesa foi poluição! Empregos foram criados, mas a poluição tornou-se parte da
vida do povo chinês. E isto precisa ser mudado. O desejo é o de reduzir a
marcha do crescimento em 30%, não mais do que isto, mantendo-o em torno de 6,9%
ao ano, até 2020.
► Afirmou que pretendem utilizar este
espaço como margem de manobra para atingir três objetivos. O primeiro é a
redução da capacidade ociosa, por que a maior parte das indústrias com
capacidade ociosa é pesada e está situada na siderurgia, indústria naval e
extração do carvão. Este objetivo está interligado com a redução dos
empréstimos dos governos locais.
► O entusiasmo das autoridades locais no
sentido de aumentar o PIB gerou uma competição de província contra província,
expandindo os empréstimos e o crédito. E isto não é bom. O terceiro objetivo é
mudar paulatinamente o modelo de crescimento, reduzindo o investimento em
capital fixo, mas aumentando o consumo interno, através de ganhos de
produtividade.
► E o aumento da produtividade virá da
inovação. Não se pensa mais na terra barata e na mão de obra barata. A inovação
para alcançar o crescimento doméstico significativo, resultante de uma maior
renda per capita e do aumento da produtividade, dependem de ousadia e da
capacidade de realizar reformas e a abertura da economia.
► O equilíbrio entre ousadia e
credibilidade é necessário para superar problemas. Entre os riscos, estão
previstos o da queda da taxa de lucro e a automática valorização dos ativos.
Leva tempo para se corrigir este trade-off. Algo como a poluição, que agora
está criando um efeito adverso, obriga a pensar em como mudar o modelo de
crescimento e em quanto tempo faze-lo.
► Liu Mingkang não deixaria de citar um
provérbio chinês. Segundo ele, é recomendável manter as cartas próximas do
peito. O processo será doloroso, mas sem dor, não há vitória.
*Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
A
coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no
centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
Através
dela, são apresentados casos de empreendedores e empresas,
pesquisas,
resenhas, editais ou agenda, relativos à responsabilidade social, à
sustentabilidade
e
ao desenvolvimento sustentável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário