terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Albufeira Meads em perigo
                                                             
Antecipar-se às ameaças ambientais, desenvolvendo alternativas antes que os problemas estejam instalados, é a forma de construir o futuro desejado. E não se lamentar dele.

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economia&arte

EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*


►      Nos anos 1930, as economias industriais do Ocidente buscavam a sintonia fina das suas políticas econômicas, na tentativa de superar a profunda crise em que atolaram. As fórmulas que até então eram utilizadas, geralmente baseadas na expansão da oferta de moeda, deixaram de produzir os efeitos desejados.

►      Enquanto J.M. Keynes produzia o famoso “Teoria Geral dos Juros, do Emprego e da Moeda”, apresentado em 1936, guia da profunda transformação por que passou a economia, tentativas de superar o desemprego crescente foram praticadas intuitivamente. É contemporânea dessa época a construção da represa Hoover, localizada entre os estados norte americanos de Nevada e Arizona. Inaugurada em 1º de março de 1936 é, até hoje, considerada a maior obra de engenharia do país.

►      A albufeira da barragem Hoover é o lago Mead, maior reservatório de água dos EUA, com capacidade para armazenar até 32.200 km3, abastecido pelo rio Colorado. As águas do lago Mead suprem cerca de 90% das necessidades de Las Vegas, que fica a pouco menos de 50 km do lago. A cidade, famosa por seus imponentes hotéis-cassinos, tem cerca de 600 mil habitantes que, somados aos da região metropolitana, totalizam 2 milhões de habitantes, aproximadamente. Um dos seus símbolos mais conhecidos internacionalmente são as fontes de águas dançantes, do famoso hotel Bellagio.

►      A soma de fatores como a localização em uma região desértica, o crescimento exponencial da população, a expansão imobiliária, a redução da vazão do rio Colorado e o elevado padrão de consumo de água, da ordem de 800 litros diários per capita, certamente poderiam levar Las Vegas a viver uma crise de escassez de água.

►      Tomando das mãos do acaso e assumindo a construção do seu futuro enquanto há tempo, autoridades governamentais de Nevada, estado onde se situa Las Vegas, investem preventivamente na reversão do problema. Com recursos estimados em US$ 817 milhões, está sendo construído o terceiro túnel de tomada de água, situado a 91 metros de profundidade do lago. Este túnel, previsto para se tornar operacional no final de 2015, corrige o efeito do processo de redução da quantidade de água armazenada no lago Meads.

►      Em julho de 2014, pela primeira vez, o Meads registrou menos de 40% de sua capacidade total e, com o ritmo de redução da sua lâmina d’água, no final de 2015, um dos túneis de captação, o mais antigo, dos anos 1960, a 33 metros de profundidade, ficaria inoperante. Assim sobrecarregaria o segundo túnel, construído no início dos anos 2000, que capta a água a 48 metros de profundidade.

►      As obras estão sendo complementadas com a edição de leis, como a que obriga os hotéis a reciclar a água de que se servem, incluída a da descarga dos banheiros. Ou da proibição de que as residências mantenham jardins com grama, que precisam ser regados, substituindo a grama por pedras.

►      Ainda assim, há 50% de chances do lago Meads ser considerado morto, até 2036, com consequências dramáticas para a cidade de Las Vegas, se não avançarem as negociações para, após uma década de seca, poupar o rio Colorado, que não consegue repor as perdas do lago Meads, dado o alto nível de consumo de cidades a montante do rio, como Los Angeles e Phoenix.

Política de águas e emissões

A agência Thomson Reuters (http://thomsonreuters.com/) publicou o relatório “Global 500 greenhouse gases performance 2010-2013: 2014 report on trends (http://thomsonreuters.com/corporate/pdf/global-500-greenhouse-gases-performance-trends-2010-2013.pdf)”. Nele, estão computadas as emissões de gás carbônico, metano, óxido nitroso e outros gases causadores do aquecimento global das 500 maiores empresas do mundo, em 2013.

Expresso em unidades equivalentes a milhões de toneladas de CO2 (mi ton), é a seguinte a relação das 20 gigantes mais poluentes.

(1º) Petrochina (China): 311 mi ton;

(2º) China Petroleum & Chemical Petróleo (China): 249 mi ton;

(3º) Arcelor Mittal (Luxemburgo): 207 mi ton;

(4º) NTPC (Índia): 201 mi ton;

(5º) RWE (Alemanha): 167 mi ton;

(6º) GDF Suez (França): 153 mi ton;

(7º) Duke Energy (EUA): 136 mi ton;

(8º) Gazprom (Rússia): 132 mi ton;

(9º) Exxon Mobil (EUA): 126 mi ton;

(10º) E.ON SE (Alemanha): 121 mi ton;

(11º) Enel SpA (Itália): 116 mi ton;

(12º) American Electric Power (EUA): 115 mi ton;

(13º) Nippon Steel & Sumitomo (Japão): 114 mi ton;

(14º) Holcim (Suíça): 102 mi ton;

(15º) The Southern Company (EUA): 102 mi ton;

(16º) Lafarge (França): 93 mi ton;

(17º) Posco (Coreia do Sul): 88 mi ton;

(18º) Royal Dutch Shell (Holanda): 83 mi ton;

(19º) EDF (França): 81 mi ton; e

(20º) Petrobras (Brasil): 73 mi ton.

Em nota, a Petrobras explicou que as emissões cresceram em decorrência da estiagem no Sudeste do Brasil. Com a redução da vazão dos rios, teve prejudicado o uso das hidrelétricas, ligando as usinas térmicas, mais poluentes.

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
São mais de 600 edições apresentando casos de empreendedores e empresas,
pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.

domingo, 28 de dezembro de 2014

Supermercado da xepa
                                                             

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que 1/3 de todos os alimentos produzidos são desperdiçados. Muitas vezes, o descarte é feito por danos nas embalagens, erros nos rótulos ou pela aparência.

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coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 24 de dezembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*

     A 20ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas ou, simplesmente, Conferência do Clima de Lima (COP 20), reabilitou sentimentos de conferências anteriores, como decepção, frustração e até ... esperança.

       O cenário da COP 20 é a assertiva do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC; www.ipcc.ch), segundo a qual é necessário reduzir de 40% a 70%, até 2050, tendo por base os dados de 2010, o total de emissões dos gases causadores do aquecimento global e zerar as emissões, até 2100, para frear a elevação da temperatura em 2ºC, até o final deste século.

     Em 2013, o acesso aos alimentos foi uma preocupação para 34,5 milhões de brasileiros. Este número corresponde a cerca de 17% da população residente em domicílios particulares em situação de insegurança alimentar leve, ou 14,8% do total dos domicílios onde havia algum tipo de insegurança.

       No total, 52 milhões de brasileiros não tiveram acesso ao alimento de qualidade, na quantidade satisfatória, correspondendo a residentes nos 22,6% dos 65,2 milhões dos domicílios registrados. Este número já foi pior. Em 2004, eram 34,8 % dos domicílios e, em 2009, 29,5%. É o que informa o suplemento de Segurança Alimentar da Pesquisa Nacional por Amostra Domicílios (Pnad) 2013, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

       Outro contingente, com cerca de 10,3 milhões de brasileiros, cerca de 5,1% da população, conviveu com a limitação de acesso à quantidade satisfatória de alimentos. Representam 4,6% dos domicílios. Foram casos de insegurança alimentar moderada, aquela em que as pessoas convivem com a restrição de alimentos, de modo quantitativo.

       Um terceiro contingente, com 7,2 milhões de brasileiros, equivalentes a 3,6% da população, em 3,2% dos domicílios, chegaram a experimentar a fome, em 2013. É o caso da insegurança alimentar grave, cujo grau mais acentuado é a fome. Em 2004, este percentual de domicílios era de 6,9% e, em 2009, de 5%.

    Por outro lado, em situação de segurança alimentar, o número de famílias aumentou. Passou de 70,5%, em 2009, para 77,4%, em 2013. Significa que cerca de 150 milhões de brasileiros tiveram acesso permanente e regular, em quantidade, a alimentos de qualidade.

     Segundo o estudo, nos domicílios com brasileiros em situação de insegurança alimentar moderada ou grave, 7,4% da população residente habitavam áreas urbanas, enquanto 15,8% da população estavam em áreas rurais.

     Em relação às regiões geográficas, dos brasileiros residentes em domicílios em situação de insegurança alimentar, 36,1% localizavam-se na região Norte e 38,1% na região Nordeste. O menor índice foi o da região Sudeste, com 14,5% do total dos residentes em domicílios em situação de insegurança alimentar.

      Do percentual de brasileiros residentes em domicílios em situação de insegurança alimentar grave, 6,7% localizavam-se na região Norte; 5,6% na região Nordeste, enquanto na região Sul estavam 1,9% e na região Sudeste 2,3%. Entre 2004 e 2013, o maior crescimento percentual de domicílios livres da insegurança alimentar foi o do Nordeste, com 15,5%.

       Em 2013, o estado com o melhor índice de segurança alimentar foi o Espírito Santo (89,65% dos domicílios), seguido de Santa Catarina (88,9%) e São Paulo (88,4%), enquanto no Maranhão (39,1%) e no Piauí (39,1%) verificaram-se os piores índices. Os índices de segurança alimentar de todos os estados da região Nordeste ficaram abaixo da média nacional de 77,4% e, entre os estados da região Norte, só o estado de Rondônia superou-a (78,4%).

Supermercado da “xepa”

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que 1/3 de todos os alimentos produzidos são desperdiçados, situação agravada nos países mais industrializados, onde 300 milhões de alimentos são descartados anualmente, apesar de terem condições de consumo.

Muitas vezes, o descarte é feito por danos nas embalagens, erros nos rótulos ou pela aparência. Apesar de conservarem as suas propriedades alimentícias, ficam impedidos de frequentar as gôndolas dos supermercados. Os produtos descartados são elegantemente chamados de excedentes.

Na Europa começam a surgir supermercados voltados para a comercialização de excedentes, também chamados de supermercados sociais, que oferecem descontos de até 70% sobre os preços dos alimentos. Inglaterra, França, Espanha e Áustria já têm empreendimentos deste tipo.

Na Inglaterra surgiu o Community Shop, que tem a previsão de abertura de novos estabelecimentos. Trata-se de uma marca da Company Shop, rede tradicional de distribuição de excedentes. A loja-piloto do Community Shop fica na comunidade de Goldthorpe, região de muitas famílias de baixa renda, na cidade inglesa de Yorkshire. Inicialmente, a rede vendia os excedentes para os próprios colaboradores.

O conceito do Community Shop é o de atender à população que é cadastrada como beneficiária dos programas sociais do governo, oferecendo a ela programas de apoio financeiro, apoio social, instrução sobre culinária e sobre orçamento familiar.

No Brasil, estima-se em 40 mil toneladas/dia o total de excedentes, alimentos próprios para consumo que são jogados no lixo. Este número só não é maior pela existência da tradicional instituição brasileira, conhecida nas feiras livres como “xepa”, horário próximo do encerramento, em que as ofertas e promoções derrubam os preços. E a maledicência da vizinha faladeira derruba reputações...

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
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pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade,

à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.
COP 20
                                                             

A COP 20, recentemente realizada  em Lima (Peru), teve por conceito a preparação de um rascunho capaz de se transformar em um acordo climático na Conferência de Paris, prevista para dezembro de 2015, com o objetivo de reduzir drasticamente as emissões dos gases causadores do aquecimento.

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coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*

       A 20ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas ou, simplesmente, Conferência do Clima de Lima (COP 20), reabilitou sentimentos de conferências anteriores, como decepção, frustração e até ... esperança.

       O cenário da COP 20 é a assertiva do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC; www.ipcc.ch), segundo a qual é necessário reduzir de 40% a 70%, até 2050, tendo por base os dados de 2010, o total de emissões dos gases causadores do aquecimento global e zerar as emissões, até 2100, para frear a elevação da temperatura em 2ºC, até o final deste século.

       Na inobservância desta redução, segundo o IPCC, fenômenos como secas, enchentes e degelo dos polos serão mais intensos e frequentes. A temperatura média da Terra já subiu 0,85ºC, em relação à era pré-industrial

       Esta conferência tinha por objetivo central produzir o plano de trabalho para se chegar ao acordo climático, que deverá ser aprovado na Conferência de Paris, prevista para dezembro de 2015. O novo acordo deverá suceder o Protocolo de Kioto, que foi firmado em 1997, mas sabotado pelas nações que mais emitem os gases do aquecimento e expira em 2020.

       Com encerramento estipulado para a sexta-feira, 12 de dezembro, na madrugada do sábado seguinte, o presidente da COP 20, Manuel Pulgar-Vidal, distribuiu um texto e pediu aos representantes de mais de 190 países participantes que fizessem a leitura em trinta minutos e o ratificassem como estava.

       Diante da resistência de Brasil, China, Índia, África do Sul e dos países mais pobres, a reunião estendeu-se até o domingo, quando foi aprovado o plano de trabalho, denominado “Chamamento de Lima para a ação sobre o clima”.

       Ao apagar das luzes, os países desenvolvidos cederam à inscrição no documento do princípio de que cabe aos que, historicamente, mais poluíram fazer os cortes mais incisivos nas emissões de CO2. As metas de redução, os meios para atingi-las e o ano base para referenciar as metas de redução foram considerados como da economia doméstica de cada país, que deverá chegar a Paris, em 2015, com estes aspectos definidos.

       Nos últimos anos, a China, que deixou de ser encarada como país subdesenvolvido e passou a ser vista como um dos campeões de emissões de gases causadores do aquecimento, resistiu às incursões dos EUA, União Europeia e Japão para incluir no texto um compromisso com a metodologia de contabilização dos cortes das emissões. Resistiu sob o argumento de que aspectos da metodologia poderiam violar a sua soberania.

       Outro embate se deu entre o grupo denominado Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China) e os países mais ricos, quanto à responsabilidade destes em efetuar os maiores cortes nas emissões e em financiar o enfrentamento da mudança climática. O importante princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas foi mantido (ponto para o Basic), mas foi atenuado com a inscrição de um período, acrescentando que as medidas devem ser estipuladas à luz de circunstâncias nacionais distintas (ponto para EUA, Japão e EU).

       Foi estabelecido um cronograma até a COP 21, em Paris. Os países desenvolvidos deverão apresentar os seus planos de reduções de emissões de gases causadores do aquecimento, até março de 2015. Os demais países, até junho. Em novembro, pouco antes da COP 21, as propostas serão tabuladas, para se avaliar a eficácia das metas estabelecidas voluntariamente pelos países no impedimento de que a temperatura global atinja um aumento de 2º C, comparado com os níveis pré-industriais.

       Em resumo, a COP 20 delineou três campos a serem negociados. Um deles refere-se a aspectos críticos que integrarão o acordo que sucederá ao Protocolo de Kioto, em 2020, como providências que deverão ser implementadas pelos países para conter o aquecimento (cortes nas emissões de gases, novas tecnologias, desenvolvimento de energias renováveis, contenção do desmatamento, etc).

       Outro campo de negociação refere-se às metodologias que serão adotadas para assegurar as metas de contenção do aquecimento, chamadas Contribuições Intencionais Nacionais Determinadas (INDC, sigla em inglês). O terceiro campo é dirigido aos países desenvolvidos, para que adotem providências para mitigar as emissões entre 2015 e 2020.

       Ao final da COP 20, restaram avaliações que oscilam entre o otimismo e o ceticismo. Um dos fatores que ajudou a melhorar as expectativas foi o acordo firmado entre os EUA e a China, os dois maiores geradores dos gases causadores do aquecimento, em novembro deste ano. Por ele, a China estabelece o ano de 2030 como o do ápice da sua emissão de gases causadores do aquecimento, enquanto os EUA (com a crítica do partido Republicano, é verdade) comprometeram-se a reduzir em 27% as suas emissões, até 2025, tendo por base 2005.

       Ceticismo, por outro lado, evidenciou-se na Marcha dos Povos, que contou com a participação de comunidades indígenas do Peru, do Brasil, além ONGs ambientalistas, em Lima, durante a realização da COP 20. A crítica foi feita ao caráter economicista dos mecanismos de compra de direitos de poluir (como os REDDs), que permitem compensar danos ambientais com recursos financeiros. Sabedoria dos povos que viram na conferência a ênfase na mudança climática e não na mudança sistêmica.

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

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sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

O mundo está a caminho do matadouro?                                                           
Paulo Márcio de Mello (*)
19 de dezembro de 2014

Vivemos hoje os prenúncios de uma guerra em larga escala.

Desde a crise da anexação da Crimeia à Rússia, resolvida pela legítima vontade do povo da Crimeia, por imensa maioria de votos, os EUA e seus satélites europeus decretaram sanções contra a Rússia.

Ocorre que os satélites europeus são dependentes do petróleo russo e a Rússia valeu-se desta condição. Virou-se para a China (fortemente dependente de combustível para sustentar o crescimento excepcional da sua economia nos últimos anos) e articulou uma aliança que envolve principalmente o fornecimento de petróleo, compreendendo uma rede de oleodutos, entre outras obras.

A reunião de forças destes dois gigantes criará um polo de poder militar (Rússia) e econômico (China) comparável ao dos EUA, o que para estes é intolerável, já que parece professarem a crença de que são a polícia do mundo.

Deficitários em petróleo no seu território, os EUA valem-se das reservas derivadas da guerra contra o Iraque (a guerra feita para “acabar com as armas de destruição em massa” do seu ex-aliado, Saddam Hussein, nunca encontradas).

No tabuleiro da geopolítica, os EUA movimentam peças estratégicas, como o incremento da produção interna de energia a partir do gás de xisto e do controle do cartel da OPEP. A primeira medida é um processo lamentável pelas emissões de gases causadores do aquecimento. A segunda fortalece regimes políticos que em nada contribuem para a democracia.

Os EUA têm uma posição confortável para empurrar a Rússia para as cordas no ringue geopolítico. Uma das suas armas é o preço do petróleo, o reverso da manobra que os atingiu em 1973 e 1979, com os dois choques do petróleo. Neste momento histórico, os EUA manobra para que o cartel da OPEP, formado por algumas ditaduras e regimes reconhecidamente anti democráticos, mantenha a produção em altos volumes, para derrubar intencionalmente os preços, através de uma oferta muito superior à demanda internacional.

O barril, hoje, se encontra em torno de US$ 40.00. Suficiente para quebrar a economia da Rússia, que tem uma das suas maiores vulnerabilidades na receita de exportações, fortemente concentrada na venda de petróleo (cerca de 50%). A manobra proporciona ainda ganhos geopolíticos extras: contém o crescimento chinês, inviabiliza outras economias, que têm no petróleo o seu mais importante item da pauta de exportações, casos da Venezuela e do Irã.

Como brinde, o pacto entre os EUA e parte do cartel da OPEP, depreciando os preços, forma uma reserva estratégica, para utilizar no futuro que eles acharem mais conveniente, ao inviabilizar a exploração do pré-sal brasileiro, no presente. Não é sem motivos que as primeiras vozes “amigas” no Brasil, diante das denúncias de que a Petrobras foi atacada por uma quadrilha de corruptos, amplificam as denúncias, numa histeria moralista-udenista, para falar da “necessidade” de rever o regime de partilha, segundo o qual os campos do pré sal foram licitados e que preserva o controle do desfrute pelo Brasil.

Os EUA são nossos amigos, argumentariam alguns. O secretário de estado norte-americano, John Foster Dulles, em 1958, já dizia que “as nações não têm amigos; têm interesses”. Um dia, Saddam Hussein também foi “amigo”, enquanto era útil, hostilizando o Irã dos aiatolás. Outros “ex-amigos”? Bin Laden também foi “amigo”, quando combatia junto aos adversários da ex União Soviética, no período em que esta invadiu o Afeganistão.

Os EUA recusou-se a assinar o Protocolo de Kioto e sabota medidas propostas nas conferências sobre as mudanças climáticas por que, se o barril do petróleo incluísse os custos externalizados dos danos ambientais e sociais que acarreta, não custaria menos de US$ 200.00. Por que o gás de xisto é ainda mais danoso para o ambiente do que o petróleo. Por que contando com pouco mais de 4% da população mundial, emite 16 mil toneladas de carbono, por habitante, ao ano, três vezes mais do que o restante do planeta.

O texto “Price Competition in 1955” (http://ablemesh.co.uk/PDFs/journal-of-retailing1955.pdf), do consultor de marketing Victor Lebow, é considerado um marco na transformação da sociedade de abastecimento, vivida até então, para a sociedade de consumo exacerbado, uma das expressões do “american way of life”, dos dias atuais.

Diz ele que “(...) nossa economia enormemente produtiva requer que façamos do consumo o nosso modo de vida, que convertamos a compra e o uso de mercadorias em rituais (…) que busquemos a nossa satisfação espiritual ou do nosso ego no consumo (…) a medida do status social, da aceitação, do prestígio, está baseado em nosso padrão de consumo (...) a maior coerção sobre o indivíduo para formá-lo na defesa e aceitação dos padrões, tenda a expressar suas aspirações e individualidade em termos do que ele usa, dirige, come – sua casa, seu carro, seu padrão alimentar, seu lazer (...) nós precisamos de coisas consumidas, destruídas, gastas, substituídas e descartadas numa taxa continuamente crescente”.

Sem energia, barata e abundante, não há consumo. Então, a movimentação das peças no tabuleiro prossegue. Inclui a tentativa de colocar de joelhos a Argentina, através de manipulação política da crise da dívida, por que a Argentina é detentora de grandes reservas de gás de xisto, bastante para interferir na estratégia hegemônica.

Inclui também a reabertura, após mais de meio século, de um bloqueio unilateral contra Cuba, no mesmo período em que a China financia a construção de um novo canal entre o Atlântico e o Pacífico, maior e mais moderno do que o Canal do Panamá que, uma vez operacional, colocará Cuba numa posição estratégica proeminente. Ao mesmo tempo, engrossa a voz contra a Venezuela, ameaçando-a de sanções, por conta de assuntos que são da economia doméstica daquele país.

Do ponto de vista militar, a OTAN vem sendo estendida até às fronteiras da Rússia, como ainda não tinha sido observado, nem nos tempos da Guerra Fria, com o empenho dos EUA, que detém o maior orçamento militar do mundo, próximo de US$ 800 bilhões anuais. E inclui a propaganda que apresenta os líderes de nações adversárias como tiranos, fanáticos, megalomaníacos, ou tontos, enquanto se cala sobre os tiranos, fanáticos, megalomaníacos e tontos, aliados de momento.

O primeiro teatro de guerra parece estar escolhido. É a região em que a crise entre Rússia e a Ucrânia vem sendo nutrida de diversas formas. Região que, pela proximidade geográfica, inibiria a Rússia de lançar mão do seu arsenal nuclear, comparável em poder destrutivo ao dos EUA.

Como em 1914-1918 (I Guerra Mundial) e 1939-1945 (II Guerra Mundial), a guerra tem a capacidade de incrementar rapidamente a demanda em economias com capacidade instalada ociosa e com alto desemprego, caso dos países da UE e dos EUA, como consequências da chamada “crise da sub prime”, após 2008. Há quem veja a guerra como solução para crises econômicas.

("Como todo aluno, estou com uma dúvida." Assim começou a provocação do Mateus Erthal Lutterback Dias, estudante da Faculdade de Comunicação Social da UERJ, sobre o que origina a crise do petróleo atual. Dedico este texto a ele e colegas da turma de 2014.2, uma daquelas inesquecíveis.)  

(*) Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
paulomm@paulomm.pro.br

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Letícia, mas pode me chamar de Renner...
                                                             
Um cipoal de transferências de responsabilidades entre organizações esconde os verdadeiros responsáveis pela utilização odiosa de trabalho escravo, como meio de reduzir custos empresariais. Grandes marcas lideram esta cadeia desumana.
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coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 10 de dezembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*


►  Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) encontraram trabalhadores em condições análogas a de escravos, em uma oficina a serviço das Lojas Renner, onde foram resgatados 37 trabalhadores bolivianos, em condições sub-humanas. A oficina, flagrada no final do mês passado, fica localizada na zona norte de São Paulo. As Lojas Renner receberam 30 autos de infração, no valor aproximado de R$ 2 milhões.

►  Segundo a fiscalização do MTE, foram constatadas condições degradantes de alojamento, jornada de trabalho de 16 horas, retenção e descontos indevidos de salários, servidão por dívida, utilização de violência psicológica, verbal e física, além da manipulação de documentos contábeis trabalhistas e fornecimento de alimentação sempre com base no mesmo cardápio, com alimentos vencidos, deteriorados, servidos com baratas e outros insetos. Foram contraídas infecções intestinais sérias pelos trabalhadores, em consequência.

►  Em nota oficial, as Lojas Renner declararam “não compactuar e repudiar a utilização de mão de obra irregular”. A Renner acrescentou que a oficina Leticia Paniágua Verdugues MF, onde os auditores fiscais flagraram as irregularidades, é contratada de dois de seus fornecedores, a Kabriolli e a Betilha.

►  A nota da empresa acrescenta ainda que “Todos os fornecedores da companhia assinam contratos em que se comprometem a cumprir a legislação trabalhista vigente, bem como um termo de compromisso e conduta responsável que proíbe qualquer tipo de violação aos dispositivos legais.”

►  A Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX, www.abvtex.org.br), criada em 1999, lançou no ano seguinte o certificado, que é uma iniciativa de grandes empresas varejistas para demonstrar que estão empenhadas em “coibir especialmente o uso de mão de obra análoga à escrava e atuar em defesa da formalização da cadeia de fornecedores”.

►  A ABVTEX acrescenta que “a certificação tem passado por aprimoramentos desde sua criação, mas como qualquer processo de certificação, este é impotente ante a má fé de algumas empresas de confecção”, sem dar os nomes das empresas de confecção de má fé. Possuem a certificação 7.024 empresas do setor, enquanto 2.059 estão em vias de obte-la.

►  Entre outras, chama a atenção nas afirmações da ABVTEX o retumbante sucesso que é certificar mais de 7.000 empresas em cerca de quatro anos, quase 5 empresas por dia, incluindo finais de semana, feriados e Copa da FIFA!

►  O sucesso da ABVTEX chega a ser quase inacreditável, considerando-se, como consta no seu site (http://www.abvtex.org.br/pt/quem-somos), que “o segmento do varejo está disperso em todo o território nacional, através de micro e pequenas empresas, dificultando sobremaneira o trabalho associativo”.

►  A ABVTEX entende que “o processo de certificação estimula o desenvolvimento de uma cadeia de fornecimento ética e responsável para a evolução do setor de varejo de moda no país. As empresas varejistas que são signatárias do programa assumem, além da promoção da certificação em suas respectivas redes de fornecimento, o compromisso de monitorar continuamente seus fornecedores e subcontratados”.

►  Em comunicado, a ABVTEX informou que, a oficina Leticia Paniágua Verdugues MF foi imediatamente suspensa da sua certificação de fornecedores. Em um abraço de afogado, acrescentou que a auditoria de certificação da oficina foi realizada pelo Bureau Veritas. Mui amiga...

►  Então funciona assim. A FGV e a Fecomércio atribuem à ABVTEX os Prêmios de sustentabilidade do varejo de 2012 e de 2013, respectivamente; a Renner atribui à Kabriolli e Betilha a delegação da contratação da oficina Letícia Paniágua Verdugues; a ABVTEX atribui ao Bureau Veritas a responsabilidade de auditar a oficina Letícia Paniágua Verdugues, que atribuiu à Renner um certificado que lava e enxuga as suas mãos e permite à ABVTEX declarar que “mantém-se fiel aos seus princípios que são a ética e o respeito à legislação, apoiando ações que visem a responsabilidade social, a formalização nas relações comerciais e o combate à concorrência fraudulenta”.

►  A culpa do adoecimento dos trabalhadores deve ser atribuída às baratas...


Tudo começa num ponto

Brasília tornou-se a primeira cidade brasileira a receber uma exposição do criador do abstracionismo, Wassily Kandinsky. Nascido em Moscou (Rússia), em 16 de dezembro de 1866 e falecido em Neuilly-sur-Seine (França), em 14 de dezembro de 1944, foi pintor, músico e professor. É considerado o pioneiro da pintura abstrata.

A exposição, denominada “Kandinsky – Tudo começa num ponto”, reúne, no CCBB, um conjunto de quadros, livros e fotos sobre o artista, com mais de 150 peças dos acervos do Museu Estatal Russo de São Petesburgo, de outros oito museus europeus e de colecionadores particulares, proporcionando um conhecimento maior sobre o artista, que inspirou-se em elementos folclóricos, musicais, espirituais e em rituais xamânicos.

A exposição “Kandinsky – Tudo começa num ponto, após permanecer em Brasília, percorre o Rio de Janeiro (de 27 de janeiro a 30 de março de 2015), São Paulo (de 18 de abril a 29 de junho) e Belo Horizonte (de 21 de julho a 28 de setembro. Oportunidades imperdíveis de apreciar a obra do também advogado e economista, Wassily Wassilyevich Kandinsky. Ninguém é perfeito...

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
São mais de 600 edições apresentando casos de empreendedores e empresas,
pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

“Lava Jato” e códigos corporativos
                                                             
As corporações expressam as práticas que desejam dos seus membros através de códigos de conduta. Nota-se que, nem sempre, vale o que está escrito...
blog do professor paulo márcio
economia&arte

Quarta-feira, 26 de novembro de 2014
coluna Empresa-Cidadã
Paulo Márcio de Mello*

Altos executivos de grandes empresas privadas brasileiras foram detidos pela Polícia Federal para investigações, em Curitiba (PR), em um dos desdobramentos da chamada Operação “Lava-Jato”. As empresas, entre outros instrumentos, com frequência expressam os seus credos corporativos através de códigos de conduta, ora chamados de conduta ética, ora chamados de conduta moral. Neles, é dito o que os membros da comunidade empresarial, podem fazer, ou o que não podem, na condição de integrantes da corporação.

A leveza angelical de muitos destes códigos de conduta nem sempre é capaz de sustentar o peso concreto das práticas de governança corporativa. No caso, por exemplo da Camargo Correa (em ordem alfabética), o seu Código de Conduta afirma que “O Grupo Camargo Corrêa adota os seguintes valores permanentes, originários da sua história e de sua prática.”

“Respeito às pessoas e ao meio ambiente. Agir sempre correta e justamente em relação a acionistas, profissionais, clientes, fornecedores, governos, comunidades locais e a sociedade em geral. Atuar com responsabilidade em relação ao meio ambiente”; “Atuação responsável. Atender ao estabelecido na legislação onde quer que atuemos, agindo de forma íntegra. Respeitar a diversidade de acordo com as normas universais de boa convivência humana, sem discriminação de raça, sexo, credo, religião, cargo, função ou outra”; “Transparência. Fornecer informações claras e abrangentes sobre as atividades, as realizações, as políticas e o desempenho do grupo, de maneira sistemática e acessível.” E por aí vai...

No caso da ENGEVIX, o Código de Ética, entre outras, afirma “Proibir expressamente a utilização de práticas ilegais tais como suborno, corrupção, fraudes, extorsão, propina, pirataria, sonegação fiscal, contrabando e violação de patentes e direitos autorais.”

Premiada como melhor empresa do setor da Indústria da Construção pelo Guia Melhores&Maiores (Revista Exame; Ed. Abril), “A matéria relata que a Companhia aumentou dez vezes a receita desde que a Petrobras entrou em sua carteira de clientes.” A empresa também é signatária do Pacto Global.

A empresa Galvão Engenharia SA, dispõe de uma expressa Política de Conduta e Identidade, onde se encontra, no item “Relações com parceiros, fornecedores e clientes (da área Pública ou Privada)”, que “São proibidos acordos e condutas, que tenham como objetivo ou possam causar impedimentos ou restrições à concorrência, incluindo acordos formais e informais que possam: Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público ou privado”; e “Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público ou privado.”

Por sua vez, o grupo IESA Projetos, Equipamentos e Montagens SA tem por missão “Oferecer com excelência as melhores soluções em infraestrutura através de uma empresa sustentável e transparente.” Os valores que explicita são “Respeito: Ao próximo, a si mesmo e ao meio ambiente”; “Paixão: Pelo empreendimento com ousadia e inovação”; “Credibilidade: Aos clientes, fornecedores e mercado em geral”; “Responsabilidade: Com os clientes, acionistas e funcionários” e “Simplicidade e previsibilidade: Diferencial indispensável para o sucesso.”

Sobre valores, o grupo Mendes Junior apresenta “Excelência em negócios de engenharia; Respeito ao ser humano; Cumprimento dos contratos; Perseverança e Ética”.

O grupo OAS SA, em sua “Política de QSMS”, enuncia que “executa obras e serviços relacionados com engenharia, entende que a qualidade é de vital importância para assegurar o desenvolvimento da empresa. A responsabilidade por QSMS - Qualidade, Segurança, Meio Ambiente e Saúde - é de todos e está presente em nossas atividades, atitudes e valores: Orientação para Resultados, Competência Profissional, Garra e Confiança.

O Grupo Galvão, afirma em seu Código de Ética que  “O combate à pirataria, sonegação, fraude e corrupção são fundamentais para a formação de um ambiente de trabalho saudável e uma sociedade mais justa. Todo e qualquer oferecimento ou recebimento de doações ou presentes só devem ser efetuados se livres de favorecimentos indevidos ou diferenciados.”

“A atuação dos colaboradores da Queiroz Galvão S.A. com agentes públicos e privados deverá pautar-se sempre e em todos os casos na boa-fé, cabendo-lhes manter, em quaisquer circunstâncias, os mais altos padrões de comportamento ético.”

Em Procedimentos Competitivos (inclusive Licitações Públicas) e Contratos Públicos e Privados, consta que “é vedado aos colaboradores da Queiroz Galvão S.A. praticar quaisquer condutas que possam, direta ou indiretamente, frustrar ou fraudar o caráter competitivo de procedimentos competitivos públicos ou privados, sendo também expressamente proibida a realização de atos que visem corromper representantes da Administração Pública ou do mercado privado, notadamente com a finalidade de obtenção de vantagem ou benefícios indevidos através da celebração, alteração, prorrogação ou extinção de contrato público ou privado.”

Por último, a UTC Engenharia SA vale-se de um Código de Ética, que contempla, entre outros aspectos, que “A honestidade, a dignidade, o respeito, a lealdade, o decoro, o zelo, a eficácia, a transparência e a consciência dos princípios éticos são os valores maiores que orientam a relação da UTC com seu público de interesse”; e que “A UTC não apoia nem promove a prática de fraudes de qualquer natureza.” Ou os códigos de conduta foram negligenciados por conselhos, diretorias e gerências, ou eles expressam um modo muito peculiar de governança, a governança pelo não dito.

Há muito se sabe que é preciso melhorar o nível das cadeias do Brasil. Como elas nunca tinham sentido tamanho peso do PIB em suas instalações, quem sabe o processo de melhoria começou. Assim, nenhum ministro da Justiça dirá mais que prefere a morte, nem a Justiça italiana voltará recusar a extradição de um criminoso por precariedade das instalações penitenciárias do país...

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).

São mais de 600 edições apresentando casos de empreendedores e empresas, pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Referências éticas
                                                             
Entre diversas declarações de conteúdo ético já escritas, destaca-se o projeto Millennium. Trata-se de uma iniciativa do Conselho Americano da Universidade das Nações Unidas (UNU). Outra declaração de conteúdo ético que não pode ser ignorada é a Declaração de Durban, que leva o nome da cidade da África do Sul onde foi realizada, em setembro de 2001, a III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata.
blog do professor paulo márcio
economia&arte

Quarta-feira, 12 de novembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*


Entre diversas declarações de conteúdo ético já escritas, referências para orientar ações governamentais ou empresariais, está o projeto Millennium. Trata-se de uma iniciativa do Conselho Americano da Universidade das Nações Unidas (UNU), que busca organizar uma rede de planejamento global, envolvendo pesquisadores, futuristas, acadêmicos, executivos, legisladores, educadores e cientistas.

Através de suas visões de futuro e de monitoramentos anuais, estas pessoas concentram os seus esforços para propor soluções para quinze importantes desafios que o mundo está vivendo. O Millennium fornece informações permanentes de forma que lideranças e gestores de cada região do planeta possam identificar, avaliar e analisar temas com impacto global.

São 15 os desafios globais eleitos: 1º) O desenvolvimento sustentável, expresso por uma pergunta: como podemos alcançá-lo? 2º) O desafio da água, com a indagação de como todos podem ter acesso a ela, sem conflitos.

3º) População e recursos, como podem estar em equilíbrio? 4º) Democratização, como a verdadeira democracia poderá emergir do autoritarismo? 5º) Perspectivas globais de longo prazo, como elas podem passar a nortear a criação de políticas mundiais? 6º) A globalização da tecnologia da informação, como a globalização e as convergentes tecnologias da informação e da comunicação poderão trabalhar para o bem comum?

7º) A distância entre ricos e pobres, como as economias de mercado podem ser norteadas por uma ética social que as estimule a reduzir as diferenças entre ricos e pobres? 8º) Doenças, como reduzir a ameaça de novas doenças e de microorganismos infecciosos? 9º) Capacidade de decisão, como pode ser aprimorada à medida que mudam as instituições e a natureza do trabalho?

10º) Paz e conflito, como novos valores e estratégias de segurança podem reduzir os conflitos étnicos, o terrorismo e o uso de armamentos com poder de destruição massiva? 11º) Mulheres, como a mudança no status social da mulher pode ajudar a melhorar a condição humana? 12º) Crime transnacional, como evitar que o crime organizado se torne o mais poderoso e sofisticado empreendimento global?

13º) Energia, como a demanda crescente de energia pode ser atendida de forma segura e eficiente? 14º) Ciência e Tecnologia, como as inovações científicas e tecnológicas podem ser aceleradas para melhorar a condição humana? 15º) Por último, ética global, como as considerações globais podem se incorporar no cotidiano das decisões globais?

Estes desafios, quando muito, estão apenas parcialmente equacionados mas, pela urgência de soluções necessárias, representam uma pauta que não pode ser desconhecida das organizações que se proclamam responsáveis.

Durban

Outra declaração de conteúdo ético que não pode ser ignorada é a Declaração de Durban, que leva o nome da cidade da África do Sul onde foi realizada, em setembro de 2001, a III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata.

Ela faz referências objetivas a algumas possibilidades de atuação das empresas neste temário. É o caso do parágrafo 63, que incentiva o setor empresarial, em particular a indústria do turismo e os provedores de serviços da Internet, a desenvolverem códigos de conduta, visando a impedir o tráfico de seres humanos e a proteção das suas vítimas.

No item referente ao emprego, a Declaração de Durban menciona a necessidade de organização e funcionamento de empresas cujos proprietários sejam vítimas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, com a correspondente promoção da igualdade de condições de acesso ao crédito e a programas de treinamento.

O parágrafo 104 menciona o apoio à criação de locais de trabalho livres de discriminação, através de estratégias complexas que incluam o cumprimento dos direitos civis e a proteção dos direitos dos trabalhadores sujeitos ao racismo e à intolerância racial.

No parágrafo 215, no título "Setor privado", a declaração insta os Estados a adotarem medidas para assegurar que as corporações transnacionais operem nos territórios nacionais, respeitando preceitos e práticas de livres de racismo e de discriminação.

Incentiva ainda a colaboração com sindicatos para o desenvolvimento de códigos de conduta de adoção voluntária, destinados à prevenção, ao combate e à erradicação do racismo. A Declaração de Durban oferece às empresas responsáveis um roteiro de possibilidades para aproximar cidadãos tão afastados.

Treze anos após a realização da Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata e da edição da Declaração de Durban, as mudanças na discriminação racial e na diversidade nas empresas ainda são inexpressivas.

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).

São mais de 600 edições apresentando casos de empreendedores e empresas, pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.