De Mariana (MG), visto e ouvido.
Serial Killers.
Serial Killers.
Crer para ver. Há poucos dias, estive em Mariana para entender melhor a tragédia que,
na cidade, 1ª capital do estado de Minas Gerais, com frequência, é chamada de
“tragédia anunciada” e mais, que estilo de gestão é este o da SAMARCO, autoritarismo
que nem ouve e foge da comunicação.
Coluna
Empresa-cidadã
quarta-feira,
25 de novembro de 2015
Paulo Márcio de Mello
Algumas
constatações podem até surpreender, mas formam um conjunto coerente. Ouvi
diversas pessoas, entre as mais ou entre as menos atingidas pelo rompimento das
barragens de Fundão e Santarém, no distrito de Bento Rodrigues, município de
Mariana (MG), entre desabrigados, comerciantes e comerciários, taxistas,
garçons, empregados ou aposentados da Samarco, etc.
Todos
se sentem incomodados com o tratamento da imprensa, que coloca a cidade de
Mariana no centro do rio de lama. Preocupam-se com a imagem da cidade, que
depende da receita do turismo e pode ser afetada pela difusão das notícias.
Ademais,
por motivos análogos, a ideia de uma penalização muito severa para a empresa não
encontra eco entre os habitantes de Mariana, por que a SAMARCO significa,
segundo o atual prefeito, cerca de 80% do orçamento do município. Achei curioso
que ninguém se mostre surpreso com o rompimento e aí algumas razões alinham-se.
A questão político-partidária é uma das razões determinantes. Desde 2005, a
política local trepida como os veículos que rodam sobre o piso de pé de
moleque. Foram 5 prefeitos no exercício do cargo (contando o atual, Duarte
Junior /PPS, prefeito desde 10 de junho) distribuídos por sete mandatos, com direito
a mútuas acusações de roubo e corrupção, comprometedoras da credibilidade de
uma das autoridades institucionais que deveriam fiscalizar as barragens.
A
VALE, controladora da SAMARCO, juntamente com a australiana BHP Billiton, também
tem a sua imensa quota de responsabilidade. Presidida, desde março, por um
azarão, a empresa é a terceira maior doadora de dinheiro para a campanha
política de 2014 (atrás do Grupo JBS, com R$112,7 milhões); (da
O número de auditores é sabidamente insuficiente.
Na
comissão de representação da Assembleia Legislativa para acompanhar os impactos
causados pela tragédia do rompimento das barragens da Samarco-Vale, em Mariana,
em Minas Gerais, estão 15 deputados estaduais. Sete receberam doações da
empresa – por meio da Vale para a campanha eleitoral de 2014. Isso, para os
meios políticos, faz com que a população olhe com desconfiança sobre as
intenções dos parlamentares em integrar a comissão.
A comissão foi
criada na segunda-feira (9 de novembro) e não se pode, ainda, dizer
como será a atitude dos parlamentares em relação às empresas. Os financiados
pela Samarco no grupo de acompanhamento são: Guerino Zanon (PMDB), Luzia Toledo
(PMDB), Janete de Sá (PMN), Bruno Lamas (PSB), José Carlos Nunes (PT), Gildevan
Fernandes (PV) e Rodrigo Coelho (PT).
Vale ‘ajudou’ a eleger 12 deputados
estaduais
Tarefa difícil tem o novo presidente da
VALE. Em janeiro de 2012, a empresa foi eleita “a pior empresa do mundo”, no
que se refere a direitos humanos e meio ambiente, pelo “Public Eye People´s”,
premiação realizada desde o ano 2000 pelas ONG's Greenpeace e
Declaração de Berna. Assim, a Vale tornou-se
a primeira empresa brasileira a "vencer" tal eleição. A escolha foi
realizada por meio de votação pública, tendo a Vale recebido 25 mil votos. Em
segundo lugar na eleição ficou a japonesa Tepco,
responsável pela operação das usinas nucleares de Fukushima, atingidas por um tsunami em março
de 2011.
Os
que foram diretamente atingidos pelo rio de lama estão abrigados (em hotéis ou
casas alugadas pela VALE/SAMARCO. Dói menos, por que não estão expostos ao
tempo, como em tragédias recentes que guardam alguma semelhança (Nova Friburgo,
São Luís do Paraitinga).
Como
em tais casos, a solidariedade encontrada agora em Minas Gerais, contraria a
frase do mineiro Otto Lara Rezende, de que “o mineiro só é solidário no
câncer.” As doações chegam com a mesma força da lama que vitimou. E muitos
voluntários, separam, limpam, classificam e distribuem a grande quantidade de
materiais doados.
O
autoritarismo das empresas, seja pelo DNA do período histórico em que foram
implantadas e prosperaram (ditadura), seja pelo DNA burocrático/autotitário/taylorista,
seja ainda pelo DNA natural de toda empresa que externaliza custos, como
racionalidade básica, também respondem pela ocorrência do rio de lama.
É
da crença da população que era sabida a iminência do desmonte da barragem, mas
denunciado dentro dos muros da empresa, transforma-se em memorando, comissões,
reuniões, e o denunciante em dedo-duro.
Ruindo
mesmo está a credibilidade das instituições. Denunciar a quem? Só restou mesmo
o bispo... Empresa que gera 80% da receita orçamentária do município “é grande
demais para quebrar”. Mas, se os gestores de uma ou de outra matassem um animal
silvestre, cometeriam crime ambiental. Diante de tantos que mataram, por
negligência ou por imprudência, é de se perguntar por que ainda não se
apresentaram à delegacia, entregaram os passaportes, não tiveram os bens
tornados indisponíveis e por que ainda não tiveram prisão preventiva decretada?
Paulo Márcio de Mello
paulomm@paulomm.pro.br