quarta-feira, 28 de agosto de 2013


Grande demais... (II)                                                                                                                                                 
 

    Por que há uma distância tão grande

entre o discurso e a prática da ética pelas grandes corporações?

A empresa predadora é índole inscrita no seu DNA?

Já passou da hora de se investir em outro paradigma corporativo,

como fazem o Comitê 20/20, as “B Corps” ou “FP Corps”.

 

blog do professor paulo márcio

 economia&arte

  

Quarta-feira, 28 de agosto de 2013
coluna EMPRESA-CIDADÃ

Paulo Márcio de Mello*
 
      A quem as grandes corporações são fiéis? Para elas, o cliente sempre tem razão? Ou, os colaboradores representam mesmo o seu maior patrimônio? Ou ainda, as futuras gerações são consideradas na tomada de decisões que impactam o ambiente?
 
      No caso da investigada formação do cartel dos sistemas metroferroviários de São Paulo e Brasília, além da Siemens, contemplada com o acordo de leniência firmado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do Ministério da Justiça, outros gigantes corporativos transnacionais aparecem na trama, casos da Alstom, da Bombardier e da CAF.
 
      A Alstom, nascida francesa, em 1928, é uma das participantes dos oligopólios mundiais de infraestrutura de transporte ferroviário e de geração e transmissão de energia. Faturou €20,3 bilhões (de euros) no último exercício, com operações em cem países, nos quais ocupa um exército de 90 mil empregados.
 
      Está envolvida em um conjunto de denúncias feitas por órgãos internacionais de imprensa, entre eles o Wall Street Journal e o Der Spiegel, de pagamento de propina da ordem de US$ 6,8 milhões, para obter contratos de US$45 milhões, do metrô de São Paulo.
 
      Em sua página (www.alstom.com), afirma como seus valores a confiança (responsabilidade, delegação de autoridade, crença na importância de cada empregado e transparência), trabalho em equipe e ação para exceder a expectativa do cliente.
 
      Como “princípios básicos”, o seu “Código de Ética” apresenta “Respeitar leis e regulamentações” (Não envolver o Grupo em práticas ilegais) e “Aplicar os princípios de honestidade e justiça” (Nenhum objetivo justifica o descumprimento das regras).  Propõe também três “regras fundamentais”: “Respeitar as regras da concorrência”, “Sempre recuse a corrupção em transações comerciais” e “Cada funcionário tem um papel a exercer no controle interno”.
 
      Outra corporação investigada por suposta participação na formação do cartel dos sistemas metroferroviários de São Paulo e Brasília é a canadense Bombardier. Apresenta-se (www.bombardier.com) como a única fabricante de trens e aviões do mundo, entre eles, o famoso Learjet. No último exercício, o grupo faturou US$16,8 bilhões e empregou diretamente 71.700 pessoas, em sessenta países.
 
      Listada no Dow Jones Sustainability Index, a Bombardier apresenta, em seu Código de ética e conduta empresarial, como “valores essenciais”, a integridade (“Comportamo-nos com integridade e de forma ética em tudo o que fazemos e afirmamos...”), o compromisso com a excelência (“O nosso compromisso é demonstrar a excelência em todas as esferas do nosso trabalho...”), a orientação para o cliente (“Promovemos uma cultura centrada no cliente...”) e o enfoque no acionista (“Concentramo-nos em criar um valor accionista sustentado...”).
 
      A espanhola Construcciones y Auxiliar de Ferrocarriles (CAF), outra integrante do oligopólio internacional de transporte ferroviário, é mais uma das corporações investigadas por suposta participação na formação do cartel dos sistemas metroferroviários de São Paulo e Brasília. A CAF oferece um cardápio vertizalizado de peodutos, que vão de estudos de viabilidade à operação de sistemas ferroviários, passando pela fabricação de equipamentos, obras civis, eletrificação, sinalização e manutenção. No último exercício, a CAF apresentou um fluxo de caixa de €139,9 milhões.
 
      Em sua página (www.caf.es), a CAF também manifesta preocupações altruístas, como no caso do ambiente, “nosso grande valor”. Considera este um fator chave de sua estratégia empresarial e afirma o compromisso de colaborar para um mundo sustentável. Meios de transporte mais eficientes e respeitosos com a vizinhança são a sua anunciada contribuição.
 
      A prevalência da remuneração dos acionistas está retratada, desde o caso exemplar da queixa dos acionistas John e Horace Dodge, em 1919, contra Henry Ford na justiça do estado do Michigan. A acusação foi por ter reinvestido o resultado da empresa na capacidade instalada, na melhoria de salários e no fundo de reserva, ao invés de distribuí-lo aos acionistas. A Suprema Corte deu ganho de causa a Ford, com o entendimento de que a decisão beneficiaria os acionistas futuramente.
 
      As intenções meritórias das corporações em relação a outros grupos de interesse, como os empregados, os clientes, as próximas gerações, ou o ambiente, seguem o determinante objetivo de um paradigma de organização, desatualizado frente a necessidades e valores contemporâneos, mas hegemônico, vocacionado para crescer, crescer, crescer e lucrar.
 
Paulo Márcio de Mello
paulomm@paulomm.pro.br
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
 

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
Através dela, são apresentados casos de empreendedores e empresas,
pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à responsabilidade social, à sustentabilidade e ao desenvolvimento sustentável.

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