terça-feira, 18 de julho de 2017

A dita “Reforma Trabalhista” sancionada  pelo presidente de facto em 13 de  julho, viola acordos internacionais assinados pelo Brasil, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

"karoshi" (I)


coluna EMPRESA-CIDADÃ
publicada na Quarta-feira, 19 de julho de 2017,
no jornal Monitor Mercantil,
por Paulo Márcio de Mello*


u      A dita “Reforma Trabalhista” aprovada no plenário do Senado, em 11de julho passado, e sancionada pelo presidente de facto em 13 de julho, rompe acordos internacionais que o Brasil assinou, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), notadamente, as convenções de números 98 (negociação coletiva), 151 (negociação coletiva para servidores públicos), 154 (promoção da negociação coletiva) e 155 (segurança e saúde dos trabalhadores).

u      Segundo a OIT, nas convenções 154 e 155, “as medidas adotadas por autoridades públicas para estimular e fomentar o desenvolvimento da negociação coletiva devem ser “objeto de consultas prévias e quando possível, de acordos entre as autoridades públicas e as organizações de empregadores e trabalhadores”, mas isto não aconteceu no caso.

u      Conforme a diretora do Departamento de Normas Internacionais do Trabalho da OIT, Corinne Vargha, "a adoção de um projeto de lei que reforma a legislação trabalhista deveria ser precedida por consultas detalhadas por interlocutores sociais do país." O debate, no entanto, foi interditado no caso desta reforma, por múltiplos motivos, inclusive pelo ritmo imposto à tramitação do projeto, após o golpe de estado jurídico, parlamentar e midiático que o Brasil sofreu.

u      A OIT ressalta também que "os estados membros têm a obrigação de garantir, tanto na lei como na prática, a aplicação efetiva dos convênios ratificados, motivo pelo qual não se pode validamente rebaixar por meio de acordos coletivos ou individuais a proteção estabelecida nas normas da OIT ratificados e em vigor em um determinado país”.

Mudanças sancionadas

Várias são as mudanças do texto sancionado em relação à CLT, incluindo aspectos como férias, jornada de trabalho, tempo na empresa, descanso, remuneração, plano de cargos e salários, trabalho por períodos (intermitente), tempo à disposição da empresa, remuneração, plano de cargos e salários, trabalho por períodos (intermitente), tempo à disposição da empresa, remuneração, plano de cargos e salários, transporte, trabalho em casa (home office), trabalho parcial, negociação, prazo de validade das normas coletivas, representação sindical, demissão, danos morais, contribuição sindical, terceirização, gravidez, banco de horas, ações na Justiça, rescisão contratual e multas.

Uma avaliação inicial da perda de direitos do trabalhador com a reforma trabalhista sancionada pelo presidente de facto pode ser avaliada, considerando-se alguns exemplos, como os apresentados a seguir.

Negociação
Antes
Convenções e acordos coletivos poderiam estabelecer condições de trabalho diferentes das previstas na legislação, apenas se atribuíssem ao trabalhador um patamar superior ao que estivesse previsto na lei.

Texto sancionado
Convenções e acordos coletivos poderão prevalecer sobre a legislação. Assim, os sindicatos e as empresas podem negociar condições de trabalho diferentes das previstas em lei, mas não necessariamente num patamar melhor para os trabalhadores.

Em negociações sobre redução de salários ou de jornada, deverá haver cláusula prevendo a proteção dos empregados contra demissão durante o prazo de vigência do acordo. Esses acordos não precisarão prever contrapartidas para um item negociado.

Acordos individualizados de livre negociação para empregados com instrução de nível superior e salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do INSS (R$ 5.531,31) prevalecerão sobre o coletivo.

Terceirização
Antes
As atividades-fim da empresa não podem ser terceirizadas. Há uma quarentena de 18 meses que impede que a empresa demita o trabalhador efetivo para recontratá-lo como terceirizado. O texto prevê ainda que o terceirizado deverá ter as mesmas condições de trabalho dos efetivos, como atendimento em ambulatório, alimentação, segurança, transporte, capacitação e qualidade de equipamentos.

Texto sancionado
É permitida a terceirização para atividades-fim. Não é assegurada a quarentena, nem a igualdade de condições de trabalho.

Mulheres, gravidez e amamentação
Antes
Mulheres grávidas ou lactantes estão resguardadas de trabalhar em lugares com condições insalubres. Não há limite de tempo para avisar à empresa sobre a gravidez.

Texto sancionado
É permitido o trabalho de mulheres grávidas em ambientes considerados insalubres, desde que a empresa apresente atestado médico que garanta que não há risco ao bebê nem à mãe. Mulheres demitidas têm até 30 dias para informar a empresa sobre a gravidez.

O cenário de perda de direitos e de precarização das relações de trabalho impostas pelo novo texto obedece a alguns conceitos, como o da prevalência do negociado sobre o legislado, inibidor da atuação da Justiça, e, parte equivocadamente, da noção de que o barateamento do trabalho aumentará as possibilidades de produção, independentemente da consideração sobre as condições que interferem na sua produtividade.

A relação Homem-Trabalho, lembrando Christophe Dejours, psiquiatra e professor de medicina do trabalho na Faculdade de Medicina de Paris (em Psicodinâmica do Trabalho; Ed Atlas; 1994), “o organismo do trabalhador não é um ‘motor humano’; o trabalhador não chega ao seu local de trabalho como uma máquina nova. Ele possui uma história pessoal que se concretiza por uma certa qualidade de suas aspirações, de seus desejos, de suas motivações e de suas necessidades psicológicas”.

E conclui Dejours, “o bem estar não advém só da ausência de funcionamento, mas, pelo contrário, de um livre funcionamento, articulado dialeticamente com o conteúdo da tarefa, expresso, por sua vez, na própria tarefa e revigorado por ela. O funcionamento mental do trabalhador é uma das maiores causas do seu adoecimento.”


Paulo Márcio de Mello
* Professor da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)


A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001,
toda quarta-feira, no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).

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à responsabilidade social, à sustentabilidade e ao desenvolvimento sustentável, casos de empreendedores e empresas, pesquisas, resenhas, editais ou agenda no assunto.
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