quarta-feira, 15 de maio de 2013

Na contramão.

                                                                                                                                                                 Quarta-feira, 15 de maio de 2013
coluna Empresa-Cidadã 
Paulo Márcio de Mello

Quando maio de 2015 começar, estará concluído o ciclo dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), instituídos pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2000, como “maior esforço global de combate à pobreza da História”, no dizer do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.

Os oito objetivos estipulados são erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir a universalização do ensino básico; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e; estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.

Para alcançar as metas até 2015, a ONU está realizando uma campanha de mobilização, denominada MDG Momentum: 1000 Days of Action, em que há uma forte expectativa de contribuição das mídias sociais para o derradeiro esforço da campanha. A hashtag#MDGmomentum será mobilizada nesta reta final.

No Brasil, alguns aspectos que ainda podem impactar os ODMs merecem especial atenção, como no caso do ingresso das crianças na educação infantil. Apesar da porcentagem de crianças até 6 anos em extrema pobreza ter caído de 13,3% para cerca de 3%, ainda se observa uma forte discrepância entre as situações, conforme as classes sociais.

Dados apresentados pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República indicam que, em 2011, 45% das crianças com até três anos de idade, originárias das famílias localizadas no topo da pirâmide, os 10% mais ricos, frequentavam creches. Entre as famílias na base da pirâmide, os 10% mais pobres, o acesso à creche situou-se em torno de apenas 12%.

A distância entre estas crianças também aumentou. Entre 2001 e 2011, na proporção entre as que frequentaram creches, observou-se um crescimento de 14 pontos percentuais, entre os 10% mais ricos, enquanto entre as crianças situadas nos 10% mais pobres, o crescimento foi menor, de 6 pontos percentuais.

Outro aspecto importante está retratado no artigo “Fracasso Escolar e Desigualdade do Ensino Fundamental”, realizado pela pesquisadora Paula Louzano e publicado no relatório “De Olho nas Metas de 2012”, lançado pelo movimento Todos pela Educação, com base no questionário da Prova Brasil 2011, respondido por 2,3 milhões de alunos do 5º ano, em âmbito nacional. O artigo conclui que, quando os estudantes chegam ao 6º ano do ensino fundamental, 7% dos alunos brancos têm mais de dois anos de atraso escolar, mas entre os negros, o indicador chega a 14%.

Em relação aos casos de reprovação ou abandono, um terço das crianças havia experimentado a situação de insucesso na escola. Destes, 43% se autodeclararam pretos, 34% pardos e 27% brancos. Observados os resultados regionais, verifica-se que na região Sudeste, a que apresenta os menores índices nacionais de reprovação ou abandono, estas foram as opções de 36% dos alunos pretos, 27% dos pardos e de 22% dos brancos.

A diferença de gêneros também pondera os resultados. Os menores índices de fracasso na escola (ou da escola...), observados na região Sudeste, para meninos pretos é 42,3% e para meninas pretas é 29.8%. Entre meninos brancos, o percentual é de 26,5%, enquanto entre as meninas brancas é de 17,3%.

No Nordeste, estudantes do sexo masculino, autodeclarados pretos, têm 59% de chances de serem vitimados pelo fracasso escolar. No Norte, o índice é de 59,3%. A expectativa de uma menina, autodeclarada preta, fracassar na região Nordeste é 45,5% e de 45,8%, na região Norte.

Entre os alunos, autodeclarados brancos, observou-se o índice de 50,9% de insucesso na região Nordeste e de 52,2%, na região Norte. Entre as meninas, os índices são de 37,5% na região Nordeste e de 38,8% na região Norte.

Na contramão dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, aumentou a escassez de recursos para que os países de baixa renda universalizem o ensino básico, nos últimos três anos, conforme números do relatório “Tornar a Educação Acessível até 2015 e no Período Posterior” (Making Education for All Affordable by 2015 and Beyond), apresentado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Dos necessários US$ 53 bilhões anuais para universalizar o ensino fundamental, apenas metade é investida, acarretando um déficit de cerca de US$ 26 bilhões anuais. Se o ensino médio for incluído na conta, a necessidade de recursos passa para US$ 77 bilhões anuais, elevando o déficit para US$ 38 bilhões anuais.

Paulo Márcio de Mello
paulomm@paulomm.pro.br
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001,
toda quarta-feira, no jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
Através dela, são apresentados conceitos relativos
à responsabilidade social, à sustentabilidade e ao desenvolvimento sustentável,
casos de empreendedores e empresas, pesquisas, resenhas, editais ou agenda.

 

9 comentários:

  1. Bom o problema evidente é a desigualdade social. Além da falta de estímulo financeiro e social, há também o preconceito entre as classes o que dificulta mais ainda. Os dados acima que relatam pessoas de cor parda e etc são apenas o reflexo desse problema.

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  2. Entre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, a educação, na minha opinião, é o mais importante objetivo e que mais carece de atenção no Brasil. Para um país que está entre as 10 maiores economias do mundo, a qualidade da nossa educação é medíocre. Se a dificuldade para outros países subdesenvolvidos em eliminar ou diminuir esses objetivos seja a falta de recursos, não acredito que esse seja o mesmo problema para o Brasil, o maior problema para o nosso país é a falta de organização com que é destinado o dinheiro e como ele é empregado para a educação. Então a melhora na educação depende da melhora do empenho das pessoas e organizações governamentais. Acredito que se conseguíssemos acabar com o atraso da educação brasileira, os outros objetivos seriam mais fáceis de serem atingidos, porque a educação é a base de tudo e todos os outros objetivos direta ou indiretamente passam por ela.

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  3. O Relatório dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio 2012 que foi lançado em julho de 2012 pelas Nações Unidas traz boas notícias: três dos oito objetivos estabelecidos por todos os Estados-Membros da Organização em 1990 já foram cumpridos em nível global. São eles: reduzir pela metade o número de pessoas vivendo na extrema pobreza; reduzir pela metade a proporção de pessoas sem acesso a água potável e melhorar a vida de pelo menos 100 milhões de habitantes de favelas.
    O Relatório afirma que o cumprimento das metas restantes, ainda que difícil, é possível, mas somente se os governos não renunciarem aos compromissos assumidos ao longo da década passada. Mas o sucesso depende de cumprir o ODM 8 – a parceria global para o desenvolvimento – diz Ban Ki-moon (Secretário Geral das Nações Unidas) em seu prefácio ao Relatório.
    “As crises econômicas atuais, que afligem grande parte do mundo desenvolvido, não podem desacelerar ou reverter o progresso que tem sido feito. Vamos construir sobre os sucessos que alcançamos até agora, e não vamos ceder até que todos os ODMs sejam atingidos”, afirma o Secretário-Geral.
    Assim como esses objetivos foram cumpridos, se houver foco e dedicação ainda é possível de se cumprir mais algumas metas, ainda que não todas.

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  4. Não se tem dúvidas que o Ciclo dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio para erradicar a pobreza e a fome do mundo é uma excelente iniciativa. Mas daí a achar que em maio de 2015 seus objetivos serão atingidos é muito otimismo.
    Podemos observar a melhoria de vida de milhões de pessoas através do cumprimento das metas de redução da pobreza, do aumento do acesso a água potável e da melhoria na qualidade de vida dos moradores de favelas, como o Relatório afirma.
    Mas, ao mesmo tempo, as pessoas que vivem em situação de pobreza ou em áreas rurais permanecem em uma desvantagem injusta. "Em 2011, apenas 53% dos nascimentos em áreas rurais foram assistidos por pessoal de saúde qualificado, em contraste com 84% nas áreas urbanas. Oitenta e três por cento da população sem acesso a fontes apropriadas de água potável vivem em comunidades rurais.", afirma o Relatório. Além disso, o cumprimento dos Objetivos vem sendo prejudicado pela redução da ajuda financeira global e os países mais pobres estão sendo os mais afetados negativamente.
    No Brasil, a desigualdade social ainda é muito grande, quase não há mobilidade entre as classes, muitas crianças ainda deixam de ir à escola para trabalhar, principalmente em áreas rurais com o intuito de ajudar na renda familiar. Existe um grande preconceito em relação a gênero e raça, no mercado de trabalho, muitas mulheres continuam ganhando menos que os homens, mesmo estando no mesmo cargo. O percentual de negros em todos os níveis escolares ainda está muito aquem quando comparado ao do branco. Quanto a sustentabilidade ambiental, nem é preciso comentar, algumas empresas já estão tirando a responsabilidade socioambiental do papel, mas a maioria ainda visa o lucro em detrimento as externalidades negativas que causam a sociedade.
    Por essas e outras que acho que a ONU ainda terá muito trabalho, porque se no Brasil a situação tá bem distante do ideal com certeza, outros paises passam por situação igual ou pior.

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  5. Carollina Rego Rodrigues28 de julho de 2013 às 10:40

    Pode-se dizer que o maior problema de um país ligados a economia e desenvolvimento está na pouca importância dada ao ensino, à educação.
    Realizo um trabalho voluntário de ensino religioso em uma comunidade do Rio de Janeiro. Existem crianças com mais de 8 anos e adolescentes (por volta dos 15 anos) que não sabem ler. E são aprovados, todo o ano no colégio municipal que frequentam.
    Com uma educação precária, principalmente a pública, em que alunos são aprovados automaticamente não é de se espantar que entrem para as estatísticas dos "desistentes".
    Educação de qualidade deve ser a maior preocupação e foco de investimento de qualquer país sério.
    Como já disse em outro comentário, a solução está em educar as pessoas. Está na hora de mudança de mentalidade, onde pessoas com uma educação de qualidade se preocupará e terá "noção" da importância da buscar uma economia sustentável, lato sensu.
    Acredito que focando em uma educação de qualidade, os ponto relacionados a igualdade entre os sexos, saúde, combate a doenças, sustentabilidade ambiental e parceria mundial em prol do desenvolvimento, serão mais "facilmente" executados.

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  6. Igor Seixas de Carvalho31 de julho de 2013 às 10:08

    A educação sem dúvidas é a base para a mudança de toda sociedade. Infelizmente, na maioria dos países subdesenvolvidos e/ou em desenvolvimento os investimentos em educação e cultura não tem a importância que merecem. Caso contrário os avanços seriam muito mais rápidos e mais "limpos" devido a conscientização da população. O problema é que uma maior educação da população colocaria em cheque a liderança da aristocracia moderna(os cerca de 15% mais ricos) que são quem detêm os meios de comunicação, os meios de produção e, principalmente, detém enorme influencia política.

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  7. As pesquisas realizadas por regiões mostram percentuais de rendimentos escolares diferentes, não só entre classes sociais, mas também entre as raças e gêneros, tendo a raça negra o pior desempenho em ambos.
    Será mesmo que se conseguiria universalizar o ensino fundamental apenas com um investimento de US$ 53 bilhões anuais?
    A intensa desigualdade socioeconômica existente em nosso país, assim como a desigualdade social entre as raças, não depende apenas de investimentos financeiros em estruturas e instalações físicas para oferecer um ensino de qualidade.
    Acredito que um dos maiores entraves para se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, não se dê pela falta de dinheiro investido, e sim porque ainda possuímos uma mentalidade racista muito forte que vai contra a esta politica de igualdade.
    Em nossa sociedade, as pessoas crescem sendo moldadas com mentalidade e valores preconceituosos e racistas, o que contribui para o crescimento de nossas desigualdades. Para rompermos esta condição será preciso muito mais do que investimento financeiros.

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  8. Muito dinheiro é necessário para que de fato o Brasil seja um país educado em todos os níveis. Mas porque não ocorre a universalização? Todos sabem a velha máxima que um país educado não vai votar nos mesmos pilantras que roubam sem usarem máscara. Sabemos de cor que um país com níveis elevados de educação também será um país onde virtualmente as desigualdades sociais diminuirão. Embora o próprio conceito de educação deva ser sempre rediscutido, uma vez que nos aspectos meramente formais podemos ter cem por cento da população alfabetizada, mas se não for criado um senso coletivo em prol da razão pública, onde cidadania significa muito mais do que ir votar na urna eletrônica, e sim onde o indivíduo tenha meios para que suas ações visem a todos os seus semelhantes. Tal educação que anda em falta é a ética, e se conseguirmos aliar os progressos tecno-científicos a um progresso moral, onde deixaremos de estacionar nossos carrões nas calçadas, pararemos de agir bem apenas quando tiver um guarda olhando, dentre outras coisas. Pode todo o mundo ter uma taxa de cem por cento de alfabetizados, porém esse conhecimento será usado para a dominação de outro ser humano se não houver o progresso moral, muito em falta hodiernamente. São louváveis as metas estipuladas pela ONU, pois percebemos um esforço real de mudança paradigmática, mesmo que seja difícil abandonarmos velhos hábitos. Que o Brasil não seja o próximo Estados Unidos quando alçarmos o posto de nação mais desenvolvida do planeta. Que nós não cometamos os mesmos erros morais que enlamearam tantas civilizações. Podemos aproveitar o que nos propiciam de melhor em outras áreas, como ciências, artes, medicina, tecnologia, mas tudo em prol da humanidade enquanto fraternidade de seres humanos.

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  9. Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio foram um grande passo dado pelas Nações Unidas no caminho de um mundo mais livre, igualitário e fraterno. Mas é preciso mais empenho dos governos nacionais, ONGs e demais partes interessadas para avançar nessas conquistas. Faz-se necessário mais investimentos em educação, saúde, saneamento básico e infraestrutura, de modo a facilitar o acesso da população carente à cidadania plena.

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