quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Letícia, mas pode me chamar de Renner...
                                                             
Um cipoal de transferências de responsabilidades entre organizações esconde os verdadeiros responsáveis pela utilização odiosa de trabalho escravo, como meio de reduzir custos empresariais. Grandes marcas lideram esta cadeia desumana.
blog do professor paulo márcio
economia&arte

coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 10 de dezembro de 2014
Paulo Márcio de Mello*


►  Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) encontraram trabalhadores em condições análogas a de escravos, em uma oficina a serviço das Lojas Renner, onde foram resgatados 37 trabalhadores bolivianos, em condições sub-humanas. A oficina, flagrada no final do mês passado, fica localizada na zona norte de São Paulo. As Lojas Renner receberam 30 autos de infração, no valor aproximado de R$ 2 milhões.

►  Segundo a fiscalização do MTE, foram constatadas condições degradantes de alojamento, jornada de trabalho de 16 horas, retenção e descontos indevidos de salários, servidão por dívida, utilização de violência psicológica, verbal e física, além da manipulação de documentos contábeis trabalhistas e fornecimento de alimentação sempre com base no mesmo cardápio, com alimentos vencidos, deteriorados, servidos com baratas e outros insetos. Foram contraídas infecções intestinais sérias pelos trabalhadores, em consequência.

►  Em nota oficial, as Lojas Renner declararam “não compactuar e repudiar a utilização de mão de obra irregular”. A Renner acrescentou que a oficina Leticia Paniágua Verdugues MF, onde os auditores fiscais flagraram as irregularidades, é contratada de dois de seus fornecedores, a Kabriolli e a Betilha.

►  A nota da empresa acrescenta ainda que “Todos os fornecedores da companhia assinam contratos em que se comprometem a cumprir a legislação trabalhista vigente, bem como um termo de compromisso e conduta responsável que proíbe qualquer tipo de violação aos dispositivos legais.”

►  A Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX, www.abvtex.org.br), criada em 1999, lançou no ano seguinte o certificado, que é uma iniciativa de grandes empresas varejistas para demonstrar que estão empenhadas em “coibir especialmente o uso de mão de obra análoga à escrava e atuar em defesa da formalização da cadeia de fornecedores”.

►  A ABVTEX acrescenta que “a certificação tem passado por aprimoramentos desde sua criação, mas como qualquer processo de certificação, este é impotente ante a má fé de algumas empresas de confecção”, sem dar os nomes das empresas de confecção de má fé. Possuem a certificação 7.024 empresas do setor, enquanto 2.059 estão em vias de obte-la.

►  Entre outras, chama a atenção nas afirmações da ABVTEX o retumbante sucesso que é certificar mais de 7.000 empresas em cerca de quatro anos, quase 5 empresas por dia, incluindo finais de semana, feriados e Copa da FIFA!

►  O sucesso da ABVTEX chega a ser quase inacreditável, considerando-se, como consta no seu site (http://www.abvtex.org.br/pt/quem-somos), que “o segmento do varejo está disperso em todo o território nacional, através de micro e pequenas empresas, dificultando sobremaneira o trabalho associativo”.

►  A ABVTEX entende que “o processo de certificação estimula o desenvolvimento de uma cadeia de fornecimento ética e responsável para a evolução do setor de varejo de moda no país. As empresas varejistas que são signatárias do programa assumem, além da promoção da certificação em suas respectivas redes de fornecimento, o compromisso de monitorar continuamente seus fornecedores e subcontratados”.

►  Em comunicado, a ABVTEX informou que, a oficina Leticia Paniágua Verdugues MF foi imediatamente suspensa da sua certificação de fornecedores. Em um abraço de afogado, acrescentou que a auditoria de certificação da oficina foi realizada pelo Bureau Veritas. Mui amiga...

►  Então funciona assim. A FGV e a Fecomércio atribuem à ABVTEX os Prêmios de sustentabilidade do varejo de 2012 e de 2013, respectivamente; a Renner atribui à Kabriolli e Betilha a delegação da contratação da oficina Letícia Paniágua Verdugues; a ABVTEX atribui ao Bureau Veritas a responsabilidade de auditar a oficina Letícia Paniágua Verdugues, que atribuiu à Renner um certificado que lava e enxuga as suas mãos e permite à ABVTEX declarar que “mantém-se fiel aos seus princípios que são a ética e o respeito à legislação, apoiando ações que visem a responsabilidade social, a formalização nas relações comerciais e o combate à concorrência fraudulenta”.

►  A culpa do adoecimento dos trabalhadores deve ser atribuída às baratas...


Tudo começa num ponto

Brasília tornou-se a primeira cidade brasileira a receber uma exposição do criador do abstracionismo, Wassily Kandinsky. Nascido em Moscou (Rússia), em 16 de dezembro de 1866 e falecido em Neuilly-sur-Seine (França), em 14 de dezembro de 1944, foi pintor, músico e professor. É considerado o pioneiro da pintura abstrata.

A exposição, denominada “Kandinsky – Tudo começa num ponto”, reúne, no CCBB, um conjunto de quadros, livros e fotos sobre o artista, com mais de 150 peças dos acervos do Museu Estatal Russo de São Petesburgo, de outros oito museus europeus e de colecionadores particulares, proporcionando um conhecimento maior sobre o artista, que inspirou-se em elementos folclóricos, musicais, espirituais e em rituais xamânicos.

A exposição “Kandinsky – Tudo começa num ponto, após permanecer em Brasília, percorre o Rio de Janeiro (de 27 de janeiro a 30 de março de 2015), São Paulo (de 18 de abril a 29 de junho) e Belo Horizonte (de 21 de julho a 28 de setembro. Oportunidades imperdíveis de apreciar a obra do também advogado e economista, Wassily Wassilyevich Kandinsky. Ninguém é perfeito...

Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A coluna EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
São mais de 600 edições apresentando casos de empreendedores e empresas,
pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.

Um comentário:

  1. Preferimos acreditar sem questionamentos nesses novos selos de sustentabilidade e responsabilidade social do que investigar os processos que antecedem nossa compra ou escolher outra marca. Mas que opções temos dentro de um mercado com empresas de filosofias tão parecidas?

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