Um aumento de 5% do transporte rodoviário no mundo, até 2030, poderá aumentar o
uso da água na agricultura em até 20%, em decorrência da produção de
biocombustíveis, conforme a Agência Internacional de Energia. Pela
correspondência existente, o tema escolhido pela ONU para o Dia Mundial da Água
de 2014 foi “Água e Energia”.
Coluna EMPRESA-CIDADÃ
Quarta-feira, 21 de setembro de 2016
Paulo Márcio de Mello*
Água e energia no contexto geopolítico.
u Segundo o relatório “Conjuntura de
Recursos Hídricos no Brasil – Informe 2013”, editado pela Agência Nacional de
Águas (ANA), no Brasil há cerca de 1.064 empreendimentos hidrelétricos, dos
quais 407 são centrais de geração (CGH), 452 são pequenas centrais (PCH) e 205
são usinas (UHE). Quase 70% da capacidade total do sistema de produção de
energia elétrica instalada no Brasil é hidrelétrica. Outras modalidades de
geração também são dependentes do uso de água, como a térmica e a nuclear.
Manifesto
Um grupo de 100 pesquisadores ambientais
brasileiros, de universidades e institutos, de diferentes estados, redigiu o “Manifesto de Cientistas pela Defesa
de Nossos Rios.” O documento resgata a Moção sobre Barramentos,
aprovada no X Congresso de Ecologia do Brasil (http://www.cpap.embrapa.br/pesca/online/PESCA2011_10CEB1.pdf), de setembro de
2011.
A finalidade da divulgação do manifesto é
apelar por políticas públicas eficientes em garantir a manutenção da
diversidade, incluindo-se as culturas humanas tradicionais dos ribeirinhos e os
remanescentes de ecossistemas fluviais e de sistemas associados, como as matas
ciliares, diante do crescimento de empreendimentos hidrelétricos no Brasil.
Segundo o manifesto, a Amazônia é a grande fronteira prevista para este
crescimento. Há aproximadamente dois anos, o governo federal anunciou
empreendimentos, diminuindo em mais de 90 mil hectares algumas grandes Unidades
de Conservação da Amazônia.
Um dos casos mais notórios é o
da hidrelétrica de Belo Monte (PA), em região já conflagrada, pela existência
conversão de florestas em pastagens e consequente desmatamento. Na Amazônia, há
também impactos derivados de duas grandes hidrelétricas do rio Madeira (Santo
Antônio e Jirau; RO). No Pantanal, mais de 130 pequenas e médias hidrelétricas
estão previstas ou em construção, em série nas cabeceiras dos rios dos estados
do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.
No sul do Brasil, os planos da
Empresa de Pesquisa Energética (EPE, do MME) para o rio Uruguai preveem pelo
menos 11 barramentos em série, o que causaria perdas da biodiversidade, como o
peixe dourado, que vem desaparecendo na região.
Cientistas apontam a falta de
pesquisas de ecologia e de etnoecologia, a fim de se romper a atual forma de
geração de estudos pontuais e parciais, por consultorias financiadas pelo setor
elétrico, para contemplar o interesse dos mesmos interessados na expansão das
hidrelétricas no País.
Cerca de 2/3 dos projetos de
grandes, médias e pequenas hidrelétricas estão incidindo justamente no Mapa
Oficial das Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade (Port. MMA
n. 9, 23/01/2007). O mapa das áreas definidas como de “Extrema Importância”
possui cerca de ¼ dos projetos de hidrelétricas previstos para os próximos
anos.
O manifesto destaca a
necessidade de compromissos governamentais na realização de estudos mais
abrangentes, denominados Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) ou Integrada
(AAI). Estas avaliações mais abrangentes do que os estudos de impacto ambiental
(EIA-RIMA) apresentam metodologias próximas de um zoneamento
ecológico-econômico e resultados de grande importância para os tomadores de
decisão.
Estas metodologias, com base
no Princípio da Precaução, que o Brasil assumiu perante acordos internacionais,
fortalecem a visão inteligente de se avaliar, previamente, as alternativas
locacionais, energéticas e de dimensão de empreendimentos.
Alternativas cada vez mais
viáveis e baratas poderiam gerar muito mais energia elétrica do que hoje se
utiliza no Brasil. Na Alemanha, a energia solar já é responsável por uma
geração de 30GW, descentralizada, maior do que a capacidade de geração da usina
de Itaipu.
No atual cenário geopolítico do mundo, o
domínio sobre a água é crítico e seu confisco se faz de formas sutis, às vezes,
como no caso da produção de alimentos irrigada sem a preocupação com a
conservação. E então, países como o nosso exportam água na forma de comodities,
com um simples balançar especulativo de curto prazo nos preços dos alimentos.
Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ)
A coluna
EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário
jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
Através dela,
são apresentados casos
de empreendedores e empresas, pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à responsabilidade social, à ética,
à sustentabilidade e ao desenvolvimento sustentável.
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