As listas que circulam hoje em dia fazem as antigas listas do
resultado do bicho, postadas (literalmente) nos postes de luz, parecerem
inocentes.
Coluna Empresa-Cidadã,
publicada no
jornal Monitor Mercantil,
em
Quarta-feira, 05 de abril de 2017,
por Paulo
Márcio de Mello*
Listas
Sou de um tempo em que lista mais
comentada era a do jogo do bicho. Hoje, com a jogatina oficializada pelo
próprio governo com as suas diversas loterias, listas esperadas com ansiedade
são as do trabalho escravo, dos devedores da previdência, das delações, das
leniências e até a lista do Tite.
Uma das mais controvertidas, pois tem no
governo o maior adversário à sua mais ampla divulgação, é a do trabalho
escravo, também chamada de lista do trabalho sujo. E não há água bastante para
lavá-la. Entre os 250 nomes que integram a lista, observa-se forte concentração
de empresas do agronegócio (reporterbrasil.org.br/listasuja/resultado.php).
Observa-se também dispersão geográfica,
com participação de diferentes unidades da federação, tal como Pará (63
empresas constam na lista do trabalho sujo), Mato Grosso (46), Goias (42),
Minas Gerais (34), Mato Grosso do Sul (27), São Paulo (21), Santa Catarina
(20), Tocantins (19), Amazonas (19), Piauí (16), Maranhão (14), Rondônia (13), Bahia
(12), Rio de Janeiro (12), Paraná (8), Rio Grande do Sul (8), Ceará (7),
Espírito Santo (7), Pernambuco (6), Acre (5), Alagoas (2), mais Amapá, Rio
Grande do Norte e Roraima, com uma empresa listada, cada uma.
Das 250 empresas relacionadas, 159 não
praticam o agronegócio (não são pop...), estando situadas principalmente na
produção de carvão vegetal, construção civil e extração mineral.
A difusão da lista suja só foi possível
por decisão judicial, que obrigou o Ministério do Trabalho a divulgar os nomes
dos autuados por trabalho escravo. O Ministro do Tribunal Superior do Trabalho
(TST), Alberto Bresciani, derrubou a liminar concedida pelo presidente da
corte, Ives Gandra Martins Filho, que permitiu ao governo a não divulgação da
relação das empresas e empresários que fazem parte da lista suja do trabalho
escravo. A ONG Reporter Brasil e o Instituto Pacto Nacional pela Erradicação do
Trabalho Escravo obtiveram a lista com as 250 empresas autuadas, entre 2014 e
2016.
A lista foi considerada pela Organização
das Nações Unidas (ONU) um dos mais importantes instrumentos no combate ao
trabalho escravo. O Cadastro de Empregadores da Portaria Interministerial,
regulado pela portaria 02/2011, do MTE e SEDH/PR, foi criado pelo governo
federal, em novembro de 2003, com o objetivo de dar transparência às ações do
poder público no combate ao trabalho escravo.
A relação traz os empregadores flagrados
com esse tipo de mão de obra e que tiveram oportunidade de se defender em
primeira e segunda instâncias administrativas, antes de ser confirmado o
conjunto de autuações que configuraram condições de trabalho análogas às de
escravo.
Desde 1995, mais de 52 mil pessoas foram
“libertadas” das condições análogas à escravidão em canteiros de obras,
carvoarias, fazendas, oficinas têxteis e propriedades agrícolas.
Só não entendo por que o governo, que
deveria ser o maior interessado em proteger o trabalhador, tentou dificultar a
divulgação da lista. Eu disse que não entendo?
Lista
dos devedores junto à União, à previdência e ao FGTS
Regularmente, a Procuradoria Geral da
Fazenda Nacional divulga uma das listas esperadas com mais expectativa. A lista
com os maiores devedores junto à União, à Previdência e ao FGTS (http://www.jornalcotiaagora.com.br/lista-dos-500-maiores-devedores-da-previdencia).
Desde 2016, a lista tem uma versão com a
inclusão dos devedores de FGTS, e a possibilidade de consulta dos devedores por
Estado, Município e atividade econômica, bem como a inclusão de novas faixas de
valor.
A inclusão do filtro de faixa de valor
acima de R$ 1 bilhão aponta os maiores devedores da União e do FGTS, revelando
o impacto que causam às finanças públicas e à sociedade como um todo.
A lista de devedores funciona como um
mecanismo de cobrança dos débitos com a União e o FGTS. A exposição da empresa
numa lista pública de devedores pode causar danos à sua imagem junto às partes
interessadas, podendo levar o empresário a regularizar sua situação perante a
Fazenda Nacional, seja através de um parcelamento ou do pagamento à vista.
Além disso, a divulgação dos devedores
impulsiona o controle social e o consumo consciente, permitindo ao cidadão
optar por adquirir bens ou serviços de empresas que cumprem suas obrigações
trabalhistas e fiscais.
A inclusão do filtro “CNAE” (Classificação
Nacional de Atividade Econômica) revela algo pouco abordado no Brasil, que é o
prejuízo que a sonegação fiscal causa à livre concorrência. Em setores de possível
concorrência, a presença de empresas com débitos de centenas de milhões de
reais prejudica todo o mercado, uma vez que passam a gozar de uma vantagem
sobre os concorrentes baseada num ato ilícito.
Não estão incluídos na lista débitos
parcelados ou cuja exigibilidade esteja suspensa por decisão judicial.
Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
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