Occupy e Stiglitz
O movimento “Occupy
Wall Street” (OWS) está iniciando o seu quarto ano de atividades. Incompreendido
nas primeiras manifestações, por se apresentar como um movimento sem uma
bandeira específica de lutas, encontrou as principais razões do seu êxito na
pluralidade, na ausência de lideranças formais e de estrutura, e sobretudo, na
característica de um escopo flexível de reivindicações.
blog do professor paulo márcio
economia&arte
Quarta-feira, 8
de outubro de 2014
Paulo Márcio de Mello*
► O movimento “Occupy Wall Street” (OWS) está iniciando o seu quarto
ano de atividades. Deflagrado nos EUA, o movimento incorporou o DNA de outros,
como o europeu Indignados (inicialmente M15M), na Espanha, ou como das
rebeliões de massa que nutriram a Primavera Árabe, ou mesmo dos
norte-americanos Adbusters, US Day of Rage, Anonymous, com as suas máscaras
características, e o New Yorkers Against Budget Cuts (Novaiorquinos contra os
cortes no orçamento).
► Incompreendido nas primeiras manifestações, por se
apresentar como um movimento sem uma bandeira específica de lutas, encontrou as
principais razões do seu êxito na pluralidade, na ausência de lideranças formais
e de estrutura, e sobretudo, na característica de um escopo flexível de
reivindicações.
► Contemporâneo frente a um mundo volátil na sucessão de
questões a enfrentar, em que as organizações privilegiam o domínio do
conhecimento, para daí gerar seus produtos, tornou o domínio da “tecnologia de
ocupar” a sua maior qualidade. Decantou daí o lema expressivo “nós somos os 99%
que lutam contra a ganância de 1%”.
► Na ocasião, é oportuno ler uma seleção do que Joseph
E. Stiglitz, professor
na Universidade de Colúmbia agraciado com o “Prêmio Nobel de Economia” de 2001,
escreveu sobre o OWS.
► “O slogan (‘somos 99%’) ecoa no título de um
artigo que recentemente publiquei: ‘Do 1%, para o 1% e pelo 1%’. Ele descreve o
enorme aumento de desigualdade nos Estados Unidos, onde 1% da população
controla mais de 40% da riqueza e recebe mais de 20% da renda. E os que
pertencem a este grupo rarefeito são frequentemente remunerados, de forma
extravagante, não por terem contribuído para a sociedade, mas porque são, para dizer
de forma franca, bem-sucedidos (e às vezes corruptos) caçadores de rendas
alheias.”
►
“Em todo o mundo, influência política e práticas de oligopólio (frequentemente
garantidas por meio da política) foram centrais para o aumento da desigualdade
econômica. E os sistemas tributários nos quais um bilionário como Warren
Buffett paga percentualmente menos impostos que sua secretária – ou em que os
especuladores que ajudaram a derrubar a economia global são menos tributários
do que os trabalhadores – reforçaram a tendência.”
► “Este
é um sistema no qual os banqueiros são resgatados, enquanto suas vítimas são
obrigadas a lutar pela sobrevivência. Pior: os banqueiros estão de volta a seus
gabinetes, recebendo bônus anuais superiores ao que a maioria dos trabalhadores
espera ganhar durante toda a vida, enquanto jovens que estudaram muito e
seguiram as regras do jogo não veem perspectivas de um emprego decente.”
► “O
aumento da desigualdade é produto de uma espiral viciosa. Os rentistas usam
seus recursos para criar leis que protejam e ampliem sua riqueza – e sua
influência. A Suprema Corte dos Estados Unidos, deu às corporações, numa
decisão que se tornou conhecida como Citizens United, rédea solta para
usar dinheiro e influenciar os rumos da política. Mas enquanto os ricos podem
usar seu dinheiro para ampliar o alcance de seus pontos de vista, a polícia não
permitiu que eu usasse um megafone para me dirigir aos manifestantes do Occupy
Wall Street.”
► “Eles
estão certos ao dizer que há algo errado com nosso ‘sistema’. Em todo o mundo,
temos recursos desaproveitados – gente que quer trabalhar, máquinas paradas,
edifícios vazios – e imensas necessidades não realizadas: luta contra a
pobreza, promoção do desenvolvimento e reorganização da economia para enfrentar
o aquecimento global, apenas para citar algumas. Nos Estados Unidos, depois de
mais de 7 milhões de despejos, nos últimos anos, temos casas vazias e gente sem
casas.”
► “Em
1999, os protestos em Seattle, durante o que seria o início de uma nova rodada
de negociações comerciais, chamaram atenção para as falhas da globalização e
das instituições e acordos que a governam. Quando a imprensa examinou as
alegações dos manifestantes, descobriu que havia verdade nelas. As negociações
comerciais que se seguiram foram diferentes – ao menos, em princípio. Elas
deveriam levar a uma Rodada de Desenvolvimento, para enfrentar algumas
das deficiências sublinhadas pelos protestos.”
► “Num
certo sentido, os manifestantes de agora pedem pouco: uma chance para usar seus
talentos e habilidades. O direito a trabalho com salário decente. Uma economia
e sociedade mais justas. Seu desejo é de evolução, não de revolução. Mas num
outro plano, eles estão lutando por algo grande: uma democracia em que as
pessoas, e não os dólares, falem mais alto; e uma economia de mercado que
entregue o que promete.”
► “Ambas
reivindicações estão ligadas. Como vimos, mercados sem regulação conduzem a crises
econômicos e políticas. Os mercados funcionam de forma apropriada apenas quando
enquadrados por regulações apropriadas, definidas por governos. E estas
regulações só podem ser estabelecidas numa democracia que reflita o interesse
comum, não o interesse do 1%. O melhor governo que o dinheiro possa comprar já
não é suficiente.”
Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ)
A coluna
EMPRESA-CIDADÃ é publicada, desde 2001, toda quarta-feira,
no centenário
jornal Monitor Mercantil (www.monitormercantil.com.br).
São mais de 600
edições apresentando casos
de empreendedores e empresas,
pesquisas, resenhas, editais ou agenda, relativos à sustentabilidade, à
responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável.
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